sábado, 26 de fevereiro de 2011

Parábolas Mateanas: Uma Síntese

Parábolas Mateanas: Uma Síntese



Os Fundamentos


Jesus conclui a exposição do Sermão do Monte com uma última ilustração conhecida como a Parábola dos Dois Alicerces ou Fundamentos (Mt 7.24-27). Esta ilustração exortarva o povo a praticar os ensinos de Jesus (v.28). A parábola classifica dois tipos de ouvintes e alicerces. O primeiro é o ouvinte sensato, no original “o que age com sabedoria”, a mesma palavra para “prudente” em 10.16 (phronimos). Este edifica a sua casa sobre a rocha. O segundo, que edifica a sua casa sobre a areia, é o insensato, no original, “estulto”, “que age sem refletir” (mōros). O termo é traduzido por “louco” em 5.22, e entre os judeus, chamar alguém de mōros era uma ofensa grave, passível de juízo. Porém, o termo é usado nesta ilustração para ressaltar a distinção entre o ouvinte prudente e o insensato, entre aquele que ouve e pratica e o que ouve, mas não pratica.


Cristo o tesouro incomparável


Uma leitura atenciosa do capítulo 13 de Mateus revela sete parábolas dispostas tecnicamente a fim de transmitir todo o impacto da mensagem do Reino. Três parábolas tratam das pessoas (semeador, trigo e rede), e quatro da natureza do Reino (grão, fermento, tesouro, pérola).
A parábola do semeador, discorre sobre quatro tipos de ouvintes (13.3-9; 18-23). As do trigo e do joio (13.24-30; 36-43), e da rede (13.47-50), do caráter dos ouvintes. Todavia, a do grão de mostarda e do fermento, do crescimento misterioso do Reino à parte de seu ínfimo início (13.31-35). As parábolas do tesouro escondido e da pérola argumentam do valor do reino e da racionalidade em escolhê-lo (13.44-46). A comparação do Reino aos elementos básicos do cotidiano no tempo de Jesus como o trigo, o grão, e o fermento, contrastavam com a riqueza e glória do reino esperado pelos judeus – malkût Iahweh. Contudo, a glória do Reino dos céus não está em seu princípio, mas no seu final glorioso (v.43) e na alegria dos seus participantes (v.44).

Lançai a Rede


A Parábola da Rede reafirma o tema ético e escatológico tratado na do Trigo e do Joio. Ao considerarmos a dimensão ética, observamos que Jesus atenta para a existência de um corpo misto na comunidade do Reino: Trigo e joio, peixes bons e maus (Mt 13.25,48). Os “peixes bons” são inevitavelmente os “filhos do Reino” representados também pelo “trigo”, enquanto, os “peixes maus” são os “filhos do Maligno” ou “joio”. A figura do “campo” e do “mar” são ilustrações semíticas do mundo, enquanto o que se colhe deles representa os seus habitantes (Mt 13.37; Dn 7.3; Ap 13.1). O teor ético do ensino se estende ao juízo comunitário. Este resulta da constatação da mistura entre bons e maus, de “toda qualidade de peixes”. Portanto, o tema do julgamento acha-se implícito na parábola, bem como em todo o evangelho de Mateus (Mt 7.1-5). Jesus admoesta-nos a uma atitude cautelosa na hora de julgar, de discriminar entre bons e maus (Mt 13.18-29). A transição do ético para o escatológico ocorre quando o Mestre garante a devida separação e a justa retribuição na “consumação do mundo” (v. 40), ou “consumação dos séculos” (v.49).


Ser Compassivo


A Parábola do Credor Incompassivo (Mt 18) compara o Reino dos Céus a um monarca que convoca os devedores do reino para um acerto de contas. O contexto (vv.15-22) explica o propósito da ilustração que, por estilo inverso, ressoa a Oração Dominical: perdoar a ofensa alheia assim como somos perdoados por Deus (Mt 6.12; 18.23-30). Na Oração dirigimo-nos a Deus conforme o tratamento dispensado ao outro: “perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos os nossos devedores”. Nesta, o nosso relacionamento com o outro deveria ser proporcional ao do Senhor para conosco. Em Mateus 6, a relação é eu-outro e Deus, enquanto em Mateus 18, Deus-eu e o outro. Na primeira, somos perdoados por Deus conforme o indulto que concedemos ao outro (causa imanente). Na segunda, devemos perdoar o próximo conforme somos perdoados por Deus (causa transcendente). Os dois ensinos se completam e formam um ciclo contíguo de causa e efeito condicionais: se perdoo o outro sou absolvido da culpa por Deus; se Deus me perdoa, não devo imputar ao meu próximo a sua falta.


Trabalhemos aguardando não mais do que a justa retribuição


A Parábola dos Trabalhadores situa-se no final do ministério de Cristo na Pereia. Entre os temas tratados encontra-se o divórcio (Mt 19.1-12) e o perigo das riquezas (Mt 19.16-20.16). Este último, com um refrão admoestador em 19.30: “Porém muitos primeiros serão derradeiros, e muitos derradeiros serão primeiros”, serve de fundamento para o capítulo 20, que nos versículos 8, 16 e 27 ressoa a fórmula com a ordem invertida. A discussão com o jovem rico suscitou o tema da hierarquia no Reino dos Céus, em que os “primeiros” referem-se aos judeus legalistas e ricos, enquanto os “últimos” aos pecadores e pobres da comunidade (19.19). Na Parábola dos Dois Filhos (Mt 21.28-32) o tema é retomado na oposição entre “primeiro”(pecadores) e “segundo” (líderes judeus), e, na Parábola dos Trabalhadores, nos que são recrutados entre a primeira até a hora undécima. Os judeus abastados e legalistas achavam que na manifestação do reino Messiânico ocupariam as primeiras posições em detrimento aos publicanos e pecadores. Todavia, Jesus ensina que a justiça divina não se baseia na exata retribuição das capacidades (Mt 20.10), mas na misericordiosa e justa atenção às necessidades do próximo (v.9,13). Os “últimos” aceitaram humildemente o trabalho, confiando na bondade do vinhateiro, enquanto os primeiros, no desempenho das suas capacidades. A justiça humana é distribuitiva, mas a divina, misericordiosa.


O Filho Arrependido


A Parábola dos Dois Filhos é singular dentro das narrativas do ministério terreno de Jesus Cristo. O contexto desta tem como cenário a aproximação da Páscoa (Jo 11.55-12.1,9-11; 12; Mc 11.1-11; Mt 21.1-11; Lc 19.29-44, etc.) e o término do Ministério Público de Jesus – são os seus atos e palavras na semana de sua crucificação. Os líderes judeus, inconformados com a entrada triunfal de Jesus, questionam a autoridade com que ele realiza os milagres (v.23). Diante de sua morte iminente, Jesus altera a direção de seu discurso (Mt 20.18). Antes as parábolas serviam para ocultar o ensino do Reino dos mestres judaicos, agora, ousa dar-lhes a explicação, afrontando-os (vv.31,32). Os líderes da religião judaica são o “segundo filho”, que promete, mas não cumpre, enquanto, os pecadores são o “primeiro filho”, que se negam a ir, mas depois vão. O segundo filho é hipócrita (23.13s.), incrédulo e obstinado (v.32), o primeiro sincero, crédulo e arrependido (v.29).


Sentença Contra a Religião Oficial

Os capítulos 21, 22 e 23 de Mateus são os discursos mais severos de Jesus contra as autoridades da religião judaica. São três parábolas que descrevem a rejeição dos líderes judeus: Dos Dois Filhos (21.28-32), dos Lavradores Maus (vv.33-46), e a das Bodas (22.1-14). Na primeira, os líderes rejeitam a autoridade de Jesus e de João. Na segunda, repelem os profetas e o Filho. Na terceira, recusam-se a participar do Reino glorioso de Deus. Embora mantenha as devidas distinções, a Parábola das Bodas é paralela e reforça a mensagem da Parábola dos Lavradores Maus. De início pelo estilo literário e o uso do conectivo de ligação em 22.1. Depois, por meio da violência com que o Filho e os servos foram tratados (21.38,39; 22.8). Ainda, pela rejeição aos servos do rei e do Filho do vinhateiro. E por fim, a mensagem é dirigida ao mesmo grupo numa mesma ocasião. Quanto à mensagem central, tanto na Parábola dos Lavradores quanto das Bodas, o Reino de Deus é tirado das autoridades judaicas e concedido a outros – gentios (21.43; 22.9).


Prudentes e Imprudentes

A Parábola das Dez Virgens, Dois Servos (Mt 24-45-51), e a dos Talentos (Mt 25.14-30) são imagens escatológicas que se destinam a instruir a comunidade fiel a respeito da persistência e fidelidade cristã em aguardar a Vinda de Jesus Cristo. Nas três parábolas há um tema comum ligado por uma expressão padrão que designa tempo ou duração: “O meu Senhor tarde virá” (24.48); “e tardando o esposo” (25.5); “E, muito tempo depois” (25.19). Essas construções frasais representam a consideração que cada um desses agentes tinha a respeito do tempo de retorno do seu Senhor ou noivo: “aquele mau servo disse consigo”(24.48). Por considerarem que o seu senhor tardava viveram dissolutamente (24.49), não perseveraram (25.5), e negligenciaram as suas tarefas (25.19,25). O apóstolo Pedro argumenta que nos últimos dias muitos considerariam a promessa da Vinda do Senhor como tardia (2 Pe 3.8,9), por esta razão, viveriam em suas próprias concupiscências e zombarias (2 Pe 3.3), porém o “Dia do Senhor” se manifestaria de sobressalto (v.10). Portanto, recomenda: não “descaias da vossa firmeza” (v.17).


Servo Inútil

As três últimas ilustrações do Evangelho de Mateus são parábolas apocalípticas que ensinam a respeito dos últimos dias. Dentro do contexto do Evangelho, estão dispostas sequencialmente no longo discurso ou “sermão profético” (24-25). Cada uma das três ilustrações termina com uma sentença de condenação aos maus e negligentes (24.51; 25.11-12, 30, 46), e um convite festivo aos bons (24.47; 25.10, 21,34). Na Parábola dos Dois Servos, os escribas e fariseus são o “servo inútil”, pois devido ao conceito equivocado que possuem a respeito de Deus e de sua Lei (v. 24), e por viverem enclausurados em seu próprio sistema religioso, negligenciam a verdadeira espiritualidade e o serviço a favor dos santos e do Reino de Deus. A queixa dos fariseus, anciãos e escribas ao sumo sacerdote, demonstra a compreensão que tiveram da acusação de Jesus contra eles (Mt 26.3). No entanto, a crítica aos fariseus nesta parábola é atualizada para os dias de hoje, como uma referência ao uso adequado e diligente de nossas aptidões naturais e dos dons espirituais.




Fonte: Teologia & Graça

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